quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Gosto do passado

       Foi como um relâmpago. Seguido de um vento impetuoso e uivante, nuvens negras se instalaram por sobre a ilha. De um dia claro, quente e ensolarado, meus olhos contemplaram, pasmos, o escurecer do céu. O dia desfrutava de sua 16ª hora quando o céu se manisfestou, junto com toda a fúria do vento, se revoltou também o mar, em minutos, o dia estava escuro como a noite, e o  mar, dantes calmo e navegável, se encontrava revolto e perigoso.


       Como se a ilha tivesse sido tomada para outra dimensão, podia ver o horizonte e a costa calmos, com o céu azul, sem nuvens, e claros pela presença do sol forte, enquanto aqui, a natureza se rebelava.
       As árvores declinavam, e até as mais antigas com seus troncos imensos, se inclinavam diante do vento. Fim de primavera, as flores que enfeitavam as árvores e os arbustos foram lançadas fora, tornando o caminho entapetado e colorido, não fosse a escuridão que pairava, seria de agrado aos olhos. Era demasiadamente estranha a atmosfera, podia-se ver ao longe, nos 360º da ilha, que além dali tudo estava calmo e normal, enquanto aqui, experimentávamos algo que parecia ser sobrenatural.
       O vento cada vez mais forte, ia levanto tudo que via pela frente, e em instantes, o tapete de flores já não mais existia, em seu lugar estavam telhas, galhos, folhas secas, e alguns pertences que foram carregados pela força do vento. As ondas do mar estavam altas, e quebravam com  uma violência estarrecedora nas pedras do cais. Não contei minuto inteiro, antes que a água das nuvens negras varresse toda a ilha. Descera com uma força inacreditável, lavando tudo que via pelo caminho, e destruindo tudo que não provinha de estrutura fortalecida.


       Em meio à toda agitação da natureza, fui transportada por uma lembrança, e pude sentir o gosto do passado. Por um segundo, que pareceu horas, pude reviver um momento de infância, tinha o mesmo cheiro de tempestade, o barulho da água violenta banhando a terra, a escuridão que se instalava em plena tarde ensolarada, e a calmaria que pairava após o vendaval. Nesse instante, o coração apertou no peito, dolorido pela saudade, pois na lembrança tudo estava sendo revivido, exceto a presença dos amados que ao meu lado estavam na outra ocasião. Faltava o irmãozinho, a segurar minhas mãos e dizer que tudo ficaria bem, faltava a mamãe, que cuidava da casa de modo a amenizar o barulho, e cuidar que nenhuma janela estivesse minimamente aberta, de modo a deixar entrar o vento gelado, e faltava o papai, que vinha molhado da garagem, recém chegado do trabalho, com um sorriso nos lábios e chocolates nas mãos, à fazer a situação assustadora se tornar engraçada.
       Por um breve instante, presenciei o que poderia ser o fim do mundo, e me transportei para casa, mas, foi realmente por um breve instante.
       Alguns poucos minutos depois, o céu estava branco, as ondas do mar pareciam obedecer à alguma ordem, aquietando-se ligeiramente, as águas que inundaram, naqueles poucos segundos, os caminhos da ilha, retrocediam rapidamente, e as nuvens negras, que agora jaziam brancas, começavam a se despedir dali, dando lugar aos raios do sol que estava sobre elas, e já se podia contemplar o azul do céu novamente.
       Como se nada houvesse acontecido, os pássaros voltaram a cantar, as pessoas iam saindo aos poucos, a arrumar as coisas, e limpar toda bagunça deixada pelo vento. Momento no qual eu me virei, e pus-me a fazer as coisas de que precisava, feliz, por saber que a saudade manisfestada, estava prestes a acabar.

Susan Oliveira