quinta-feira, 1 de março de 2012

Reflexo


       É verão, a janela está aberta e a agradável brisa noturna acaricia delicadamente tudo que encontra em seu caminho...
       Eu estou parada, sentada, olhando dentro dos seus olhos... Posso enxergar dentro deles meu mundo. Tudo que sonhei, tudo que planejei, minhas mais eufóricas felicidades, e as lágrimas incontidas em momentos de gargalhadas espontaneamente liberadas sem o menor receio... Aquele sentimento de saudade do que nunca vivi, também está ali... Está tudo ali, dentro do seu olhar, que fita os meus de maneira doce e firme.
       Ao meu redor não há ninguém, todos já foram dormir, posso ouvir o mover do ponteiro dos segundos, do grande relógio da parede lateral, que dita o tempo conforme as batidas do nosso coração... Nosso... Eles agora batem juntos. Tudo em nós está sincronizado, e perfeitamente harmonizado...
       Sua respiração, junto a minha, faz do tempo algo controlável... Sinto-me poder eternizar o momento, com um simples pensamento, ou com o mais sutil desejar do coração... Parece que encontrei o meu outro lado. Vejo-me diante da mais bela forma humana que já pude presenciar, e nada, nem ninguém, pode modificar a perfeição desse instante. O que existe nesta troca de olhares, torna a cena, não como um quadro sendo pintado, que tendo sua tinta ainda molhada, pode borrar-se, e sim como o esculpir de uma rocha, praticamente inalterável, imutável.
       Tudo está perfeito, mas... Espere... Algo se modifica... Talvez a iluminação esteja oscilando... Talvez a energia tenha sofrido uma pequena alteração... Não! O que está havendo?? Sua imagem está ficando ofuscada, mal posso focar meu olhar em seus olhos... Paro. Aperto os olhos. Abro-os novamente, na tentativa de contemplá-lo... Nada! Onde está sua imagem?? Onde está aquele ser?? Pra onde foi quem tinha meu mundo nos olhos??
       Levantei-me... Estou agora estagnada e ofegante. Faltam-me palavras para a penosa constatação...
       Tudo que vi, tudo que senti, tudo que presenciei num sonho acordada, não passara de um reflexo no espelho... A iluminação deste cômodo sofrera contorções explicadas pela óptica, e unida ao sentimento que rasgava meu peito, como alguém que se encontra sem ar a metros abaixo das ondas do mar, e dá tudo de si para emergir mais uma vez e absorver o máximo de oxigênio possível, me fizera ver o que nunca existiu... Criei o encontro perfeito, o momento sonhado, o presente almejado...
       Agora eu firmo o olhar novamente, no que antes era a mais agradável figura já vista, e o que vejo sou eu, refletida no espelho, com uma expressão de profunda frustração. Então me viro, dirijo-me cabisbaixa à janela para fechá-la, puxo as cortinas, volto-me ao canto direito do quarto, apago as luzes, e em meio à escuridão total, deito-me, desiludida, e durmo... Amanhã, tudo não passará de uma vaga lembrança...

Susan Oliveira