segunda-feira, 24 de setembro de 2012

O dia em que o sol não nasceu


       Era sábado. O dia amanhecera como todos os outros, e a atividade no pequeno povoado era a mesma... Seguira sua rotina, era dia de cuidar de tudo que ficara deixado de lado durante a semana, e como sempre, após declinar-se em agradecimento à Deus por mais um dia, levantou a persiana, e escancarou a janela, o ar gelado que entrara lhe chamou a atenção, fazendo-a voltar os olhos aos montes distantes, que faziam-se pintura por entre as molduras que formavam a janela, eles estavam cobertos por uma névoa densa, o que era muito raro...


       Ainda de frente à janela, do 3º andar, podia ver à esquerda o cais, onde ondas calmas se quebravam delicadamente junto às pedras costeiras, haviam poucos barcos ancorados, e podia notar, entre a névoa que pairava sobre o mar, um navio de pequeno porte, quase dobrando a linha do horizonte... Inclinando o olhar à direita, podia observar a praça, única no povoado, onde algumas crianças brincavam timidamente por entre os arbustos molhados pelo orvalho, era um dia incomum, um dia nebuloso, frio e escuro, quebrando as regras do clima quente e ensolarado daquele lugar...
       As ruas, todas de pedras sobrepostas e irregulares, estavam bastante molhadas, chovera durante toda a noite... As árvores, bastante densas, ainda derrubavam grandes gotas de água ao serem movidos pelo vento, ou terem suas folhas colididas por pássaros a brincar por entre os galhos... O dia sorria! Embora escurecido e úmido, estava calmo e belo.
       Oportuno seria, se o narrar da história não envolvesse os sentimentos internos, mas é impossível contar uma perspectiva, sem expor o que há dentro do coração. Os olhos sempre veem a mesma coisa, mas o que cada olhar enxerga, depende do mundo que há por trás dele, bem ali na alma de quem com eles observa...


       A saudade já era grande, embora os dias de separação não somassem um número muito elevado. Os pensamentos estavam soltos, não faziam muito sentido... Era um misto de foco nos afazeres domésticos, uma parcela nas matérias a serem estudadas, e uma porção considerável, que permanecia rebelde, ligada no que ficou.
       O frio contido naquela manhã, trazia lembranças doces, do lugar tão amado, mas essas lembranças, quando unidas aos fatos, tornavam-se desagradáveis... Já não era mais possível dizer o que se passava dentro da mente. Parte dela, negava desesperadamente que algo estava ruim, e como numa tentativa de amenizar o insuportável, arrastava bruscamente o foco ao racional, ao real, ao que havia ali agora, tentando ocultar o que houvera um dia. Se opondo a esta parte, havia o outro lado dela, que lutava por uma válvula de escape, que não fosse o esquecimento, brigava por um pouco de sentimentalismo, por um pouco do que faltava naquele lugar...

       Ela sabia por a razão na frente dos demais lados, mas ali, tanta racionalidade já começava a torturar. Brilhante a mente que citou um dia, as seguintes palavras:

Há certas horas, quando sentimos que estamos pra chorar,
que desejamos uma presença amiga, a nos ouvir paciente,
a brincar com a gente, a nos fazer sorrir...
Alguém que ria de nossas piadas sem graça...

Que ache nossas tristezas as maiores do mundo...

Que nos teça elogios sem fim...
Que nos mande calar a boca ou nos evite um gesto impensado...
Alguém que nos possa dizer:
Acho que você está errado, mas estou do seu lado...
Ou alguém que apenas diga:
Estou Aqui!



       De fato, ali, era mesmo o que faltava... Naquele momento, tal como o dia, dentro dela, o sol não nascera... Tudo estava nublado, úmido, e frio...


Susan Oliveira