As curvas
Tal como o bater
das asas de uma borboleta, era o silêncio que pairava em seu
coração... Sepulcral, inquebrável, a não ser pelo som de uma ou
outra lágrima que corria pela face estarrecida, e ao chegar ao chão,
parecia liberar as palavras que a boca não conseguia dizer.
Estava muito
quente, o verão se aproximara e com ele a temperatura típica
daquele lugar beira mar... Após brigar incessantemente contra os
músculos, que insistiam em permanecer estirados sobre a cama, e
contra os olhos que suplicavam pelo abaixamento das pálpebras,
levantou, abriu as torneiras da banheira e começou a organizar o que
precisaria mais tarde, entre algumas lágrimas que rolavam sem
permissão, e alguns sorrisos, formados forçadamente com a intenção
de amenizar a circunstância...
Seguindo todas
as tarefas realizadas, abriu a janela, não estava ventando, não
havia uma brisa que amenizasse o calor, mas não importava, a alma
estava falando tão alto que não sobrara percepção para o meio
exterior... Abaixou a persiana, destrancou a porta, e deixou o
aposento.
Enquanto descia
as escadas e atravessava o comprido corredor de mármore, em direção
à saída, os pensamentos e lembranças invadiam a mente, deixando
inquieto o coração... Seguiu, como se ignorasse o interior em
crise, precisava jantar, não havia tempo para dar trela ao coração.
Era sexta feira,
havia festas e reuniões por toda parte, as pessoas se interagiam e
confraternizavam, aquelas que não tinham o que comemorar, celebravam
apenas a vida, cada um do seu jeito, mas havia um par de pés, que
caminhava por entre todo o burburinho sem se influenciar, tinha o
pensamento distante e o olhar perdido.
Foi, fez o que
tinha de fazer, e voltou, em um curto período de tempo, mas tempo
suficiente para que o sol se despedisse, e lua com seus luminares
inseparáveis saudassem o início de uma noite límpida... Retornou
pelo mesmo caminho, passou pelo mesmo corredor, e subiu os mesmos
degraus. Lá em cima já estava bastante escuro, mas não acendeu as
luzes, característica típica desse estado interior, como se manter
as luzes apagadas fizesse com que as coisas ficassem menos nítidas,
já que a realidade era pouco suportável, e naquele momento, trazia
desconforto demasiado ao coração.
Entrou, andou em
direção à sacada, de onde podia avistar uma das 7 maravilhas do
mundo, e parou. Seus olhos não se voltaram à paisagem cobiçada que
se encontrava mais adiante, mas sim, ao conjunto de troncos e galhos
de uma árvore sem folhas que estava mais a direita. As curvas
formadas pelas estruturas grandes e desformes daquele árvore,
prenderam sua atenção por alguns instantes. Pode perceber que cada
curva que o tronco dava, era consequência de um desvio que ele
precisara fazer, se adaptando ao espaço livre que lhe fora oferecido
para se desenvolver.
Naquele momento,
como se cada uma das curvas tivessem a capacidade de se comunicar,
pode entender claramente, que tal como os galhos e tronco da árvore,
precisava também fazer curvas, realizar desvios, fossem eles
pequenos ou grandes, pois eram fundamentais para a sobrevivência, e
o desenvolvimento naquele meio, naquela circunstância.
As curvas eram
uma lição de adaptação. Antes de estarem ali imóveis e
imodificáveis, passaram por várias etapas, e necessitaram de tempo
e persistência, para deixarem de ser uma semente, um pequeno
arvoredo, para serem agora uma estrutura enorme e exuberante, forte e
robusta. Entendeu, que tal como a árvore, e tudo na vida, havia
mudança, adaptação, persistência, antes de haver estabilidade, e
cumprimento de metas.
Imaginou,
naquele momento, viver dali em diante se lembrando das curvas que os
enormes troncos faziam, tornando-as um exemplo de que é possível
crescer, se fortalecer, e conquistar estrutura tal que suporte as
maiores tempestades, os dias mais quentes, bem como os mais frios,
permanecendo de pé, forte, e resistente. Com um sorriso, afastou-se
da sacada, ascendeu as luzes, abriu a porta, e entrou... Era hora da
vida seguir.
Susan Oliveira